Se eu ganhasse o Euromilhões...

quarta-feira, 29 de julho de 2009
Doaria uma grande parte à ciência. Não feches já a janela, que eu estou a falar muito a sério! Os milhões de Euros teriam destinatários específicos: a equipa de Karim Nayernia, da Universidade de Newcastle, e outras equipas, espalhadas pelo globo, empenhadas no mesmo fim. Mas o que estarão estas pessoas a fazer de tal modo importante que me levaria a abdicar de comprar a minha ilha privada para lhes dar uma maozinha? Simples – estão a pesquisar no sentido de criar gâmetas (óvulos, espermatozóides) a partir de células indiferenciadas do corpo. Tal terá como principais beneficiários dois grupos de pessoas – os casais inférteis e (sim, acredita nisto!) os casais homossexuais. Fiz a minha pesquisa e, pelo que li, ainda há um grande caminho a percorrer (e algumas dúvidas, às quais já me vou referir), mas se a meta final deste trabalho for atingida e levada ao passo seguinte, será um dia possível criar em laboratório um óvulo com o material genético de um homem, ou um espermatozóide com o material genético de uma mulher. Isto, por sua vez, significa que poderão ser concepcionados bebés com dois pais biológicos ou duas mães biológicas. Já imaginaste? Depois de descobrires que és homossexual e, como tal, dificilmente alguma vez terás um filho biológico teu e da pessoa que amas, abre-se este caminho, esta possibilidade que, mesmo estando longe de ser uma certeza, pode dar-nos tanto.

Ora, em relação às dúvidas e problemas. A equipa de Karim Nayernia já conseguiu criar células “tipo-espermatozóides” a partir de células femininas sendo que, porém, estas células não estavam maduras (funcionais, prontas para a reprodução). Nayernia argumenta que não será possível criar espermatozóides viáveis, pois o cromossoma Y é essencial para a meiose da célula (basicamente, para a célula ficar com a quantidade de material genético necessária para a reprodução). Cá por mim, eu não desanimo com esta afirmação. Em primeiro lugar, porque apesar dos meus parcos conhecimentos de Biologia, não vejo porque uma célula XX não há-de fazer a meiose, já que o óvulo também a faz (não, não vou desenvolver mais esta parte, até porque creio que nem eu me perceberia bem a mim mesma). Em segundo lugar, não tenho a certeza se o Dr. Nayernia não terá proferido tal afirmação para acalmar os ânimos.

Passo a explicar: estas investigações estão a causar algum constrangimento, em especial por entre os homens, dado que se perspectiva uma revolução na reprodução humana e um mundo em que eles não são necessários para a mesma. De referir que, num futuro próximo, a mulher será sempre necessária para incubar o feto, mesmo que este seja filho de dois homens, mas se se criar uma incubadora que simule na perfeição todas as condições do útero, a mulher será igualmente “dispensável” da reprodução. Claro que isto é uma outra história que, a desenvolver, ainda demorará bastante e, por esta razão e também pelo grande ego masculino, os homens são aqueles que para já se sentem mais ameaçados.

Há cépticos e cépticas, sim, quer dentro do mundo das ciências quer fora dele. Li um artigo de opinião (acho que foi no Daily Mail) escrito por uma gaja homofóbica e totalmente “eu-quero-homens-para-ser-dona-de-casa” que me meteu algum nojo, a dizer “tal nunca será possível; nós precisamos do toque masculino; as sociedades matriarcais não são nada agradáveis...etc, etc, etc.” O que quer isto dizer? Que há gente a par destas pesquisas que receia que as mulheres, ao não precisar dos homens para procriar, abdiquem deles e seja a perdição dos XY. Pessoalmente, creio que isto não faz sentido nenhum, entre outras razões porque isso significaria que as mulheres, por deixarem de considerar os homens indispensáveis para a reprodução, tornar-se-iam todas lésbicas. A sério, é isto que está subentendido. Reparem – não estamos a falar de clonagem, por isso a mulher nunca se ia “reproduzir” com ela mesma. Se não se reproduz com ela mesma, só nos restam duas hipóteses, ou o faz com um homem, ou com uma mulher. Assumir que todas as mulheres iam escolher parceiras simplesmente por ser possível ter um filho com elas é, no mínimo, estranho quando vindo de uma mulher heterossexual e uma grande demonstração de medo e insegurança quando vinda de um homem.

É preciso ter calma e, antes de nos pormos com visões apocalípticas de como o mundo vai desabar, temos de ser coerentes e pensar de que forma é que estes desenvolvimentos, se bem utilizados, podem trazer uma alegria infindável àqueles que, independentemente do porquê, não conseguem hoje ter um filho com a pessoa que amam. Pessoalmente, estou a torcer com todas as forças não só para que estas pesquisas avancem e cheguem a bom porto como também para que a sociedade e as mentalidades evoluam um bocado entretanto, de modo a que possamos realmente usufruir dos seus resultados. Sabê-lo possível, mas impraticável por impedimentos de comissões éticas dirigidas por velhos do restelo seria morrer na praia.
Peço-vos desculpa pela longa seca, mas quis falar sobre este tema o quanto antes. Para que saibam. Para que pensem nisto e formem a vossa opinião. Para que espalhem, para que todos saibamos que pode vir a ser possível. Eu acredito. Boa noite.


FONTES (desculpem, faltam muitas):

http://noticias.terra.com.br/ciencia/interna/0,,OI2300173-EI296,00-Butantan+tenta+criar+ovulo+a+partir+de+espermatozoide.html

http://ainserida.blogspot.com/2009/04/ovulo-dele-e-espermatozoide-dela.html

http://g1.globo.com/Noticias/Ciencia/0,,MUL1078497-5603,00-CIENCIA+COMECA+A+ABRIR+CAMINHO+PARA+FILHOS+BIOLOGICOS+DE+CASAIS+GAYS.html

http://www.telegraph.co.uk/science/science-news/3323846/Sperm-cells-created-from-female-embryo.html

http://blogs.timesofindia.com/erratica/entry/turn-of-the-screw

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